A morte de dona Hella Borges, 75
anos, depois de sofrer um acidente de trânsito ao bater na mureta da ponte e se
precipitar do Ribeirão da Velha logo após a Praça do Estudante, na Rua 7 de
Setembro chama à atenção para a necessidade de compreendermos os idosos no
trânsito.
Foto: Patrick Rodrigues / JSC |
Vivemos num país que, segundo
dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), tem cerca de 13 milhões
de idosos habilitados, número que vem aumentando junto com a explosão na venda de automóveis, da melhoria da qualidade e da expectativa de
vida. Só em São Paulo, temos 5 motoristas que renovaram a habilitação com mais
de 100 anos.
Em 2050 os idosos chegarão a 2
bilhões de pessoas no mundo, o que corresponde a 20% da população total do
globo e muitos deles ainda estarão dirigindo.
Já dizia Gabriel García Márquez
que a idade não é aquela que a gente tem, mas a que a gente sente. Só que a
gente também sente o peso da cidade que se manifesta em atividades diárias como
a de dirigir. Mas, isso não significa que idosos não possam dirigir como as outras
pessoas, afinal, tem muito mais motoristas na flor da idade que se acidentam,
ferem, machucam, matam mais do que os idosos no trânsito.
Imagem: Reprodução |
Compreendendo uns aos outros na
vida e no trânsito é possível vivermos pacificamente.
Um estudo feito em São Paulo
sobre os principais fatores envolvidos em acidentes de trânsito com idosos
relacionou: doenças pulmonares e cardiovasculares; doença cardíaca isquêmica; arritmias;
apnéia do sono; Diabetes Mellitus; doenças neurológicas; AVC; Alzheimer;
Parkinson; Neuropatias; Convulsões; Artrites e uso de remédios controlados ou
não.
O fato é que o idoso no trânsito
como pedestre tende a ser mais lento: os passos não são tão rápidos, a audição
é prejudicada, o campo visual, a percepção de profundidade, distância e
velocidade também diminui. Quem sabe seja esse o motivo pelo qual muitos idosos
sejam atropelados em cima da faixa de pedestres ou na travessia de corredores
de ônibus.
Há outras complicações naturais
que vem junto com a idade e que implicam na segurança do idoso no trânsito como
pedestre ou motorista. A catarata causa diminuição global da visão e leva
gradualmente à cegueira; o glaucoma afeta a visão lateral. Hipertensão e
diabetes também causam perda no campo visual do idoso e podem fazer com que ele
não enxergue um carro que se aproxime pela lateral ou tenha mais dificuldades
para manobrar o veículo.
Imagem: Reprodução |
O Mal de Parkinson ainda não
descoberto ou em tratamento é outro complicador para o motorista idoso devido
ao comprometimento neurológico que afeta a coordenação motora. Braços e pernas
ficam extremamente pesados e em alguns casos a pessoa perde o controle
voluntário de abertura e fechamento de pálpebras.
Convulsões causadas por quadros
secundários ao AVC, a hipoglicemia ou hiperglicemia de pacientes diabéticos
(não só os idosos) podem causar uma verdadeira tragédia o trânsito, pois quando
não controlados por hábitos e estilo de vida regrados, podem levar à fadiga, à letargia
e lentidão.
Muitos idosos tem perda das
funções cognitivas que evoluem para a demência, lapsos frequentes de memória e
dores causadas por artroses e artrites que podem deixar os movimentos e
reflexos mais lentos, causando insegurança ou dificuldades para dirigir.
É certo que o idoso não é o único
que toma remédios controlados, não é o único que sofre com o diabetes, mas, devido
às complicações trazidas pela idade eles estão mais propensos a sofrerem
acidentes.
Em relação aos remédios
prescritos com frequência na velhice, muitos deles causam sonolência, confusão
mental, tonturas, lapsos de memória, torpor e outras sensações e efeitos
colaterais que comprometem o ato de dirigir com segurança.
No Brasil, a partir dos 65 anos
todo motorista passa a renovar a CNH de 3 em 3 anos mediante aprovação nos
exames de avaliação médica e psicológica. Dependendo dos resultados desses
exames, o tempo de renovação pode diminuir.
Mas é necessário que a família e
a sociedade compreendam e apoiem o idoso em todas as suas decisões, inclusive a
decisão de continuar dirigindo ou não.
Familiares de dona Hella disseram
que ela teve um mal súbito enquanto dirigia, desmaiou ao volante, perdeu o
controle do carro e se precipitou no ribeirão. Ela até chegou falando no
hospital, mas morreu na sala de emergência.
Imagem: Reprodução |
Minha intenção é a de trazer
informações, tentar alertar sobre o que parecerá óbvio para alguns. Mas,
também, por uma questão de respeito aos mais velhos e de exercício da
cidadania, contribuir de alguma forma para que as pessoas compreendam não só os
motivos da mobilidade reduzida do idoso no trânsito, mas para que se
sensibilizem e os respeitem com a dignidade que eles merecem.
Ao se deparar com um idoso no
trânsito pense em tudo o que leu neste artigo. Não buzine, não xingue, não
apresse, não deboche. Se tiver a sorte de estar vivo, será o motorista e o
pedestre idoso de amanhã.