Somente os órgãos e entidades
executivos de trânsito do município podem legislar em assuntos locais
referentes ao trânsito, e ainda assim, não podem passar por cima de leis e
Resoluções já em vigor. Isso é o que diz o art. 24 do Código de Trânsito Brasileiro
(CTB). Isso porque cada ente na esfera federal, estadual e municipal ter
personalidade própria, bem como competências e atribuições específicas.
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O artigo 22 da Constituição
Federal de 1988 diz que “Compete privativamente à União legislar sobre: XI – trânsito
e transporte”, mas essa competência é delegada nos estados e municípios para
que possam cumprir e fazer cumprir as leis de trânsito no país. Diz,
ainda, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB): “Art. 12. Compete ao CONTRAN: I -
estabelecer as normas regulamentares referidas neste Código e as diretrizes da
Política Nacional de Trânsito;”. Mas, ainda assim, há vereadores em todo o
território nacional (e não são poucos) que insistem em perder tempo, dinheiro e
deixam de lado assuntos, projetos e votações de sua competência efetiva para
tentar legislar em assuntos de trânsito.
Há projetos de todo o tipo,
desde aqueles que querem ampliar vagas de estacionamento para idosos, gestantes
e mães com crianças de colo, até aqueles com propostas absurdas que passam por
cima de leis federais como o próprio Código de Trânsito Brasileiro e Resoluções do CONTRAN para proibir o
uso de capacete para motociclistas, obrigar a emplacar também o capacete e até
para alterar o valor da multa por tipo de infração. Fico pensando se
inconstitucionalidades deste tipo são mesmo por conta da desinformação, da
falta de conhecimento das leis justamente por quem faz leis nos municípios ou
por estarem mal assessorados.
Sobre as leis municipais que
tentam ampliar e criar vagas preferenciais de estacionamento para novos
públicos, está chovendo ações diretas de inconstitucionalidade (ADIN) no
Judiciário em todo o país. Só o TJ do Espírito Santo concedeu liminar
suspendendo 13 leis municipais já aprovadas que previa a ampliação da reserva
de vagas para gestantes e mães com crianças de colo em estacionamentos públicos
e privados. Afinal, o assunto já é regulamentado pela União nas Leis 10098/2000
e 10741/2003 (normas específicas que objetivam regular os direitos fundamentais
voltados para o bem estar de idosos e propiciar melhores condições de
acessibilidade aos portadores de deficiências físicas) e pelo CONTRAN nas
Resoluções 302/08, 303/08 e 304/08 que regulamentaram as áreas de
estacionamento específicas e as
vagas de estacionamentos especiais. Portanto, não cabe a vereador legislar
sobre assuntos de competência federal e os prefeitos que assinam uma lei dessas respondem na esfera administrativa,
penal e civil.
Para esclarecer, cabe aqui
citar o que diz a coordenadora do Registro Nacional de Infrações em Santa
Catarina (DETRAN/SC) e advogada, Graziela Maria Casas Blanco, em se tratando da
inconstitucionalidade de projetos de vereadores para legislar em assuntos de
trânsito: “Apenas quem pode legislar sobre regras de trânsito é a União. Esta é
uma legislação nacional e nenhuma lei municipal pode sobrepor-se à ela. Caso
contrário, pode ser sujeita a uma ação declaratória de inconstitucionalidade.
Se o município aprovar tem que ser feita uma ação direta de
inconstitucionalidade”.
Competência é privativa da
União
Na verdade, o que a lei
permite aos vereadores ao legislarem em interesse local no que se refere a
trânsito tem competência limitada e se restringe à assuntos como regulamentação
de fretamento, táxi e transporte coletivo. No que se refere à regulamentação de
bciciletas elétricas, por exemplo, os vereadores podem apresentar emendas e
melhorias, mas desde que o projeto saia das mãos do Executivo, justamente por
conta do que diz o art. 24 do CTB dentro daquilo que compete aos órgãos e entidades
executivos de trânsito nos
municípios, no âmbito de sua circunscrição.
Isso significa que nos
municípios a autoridade máxima é o prefeito, embora ele delegue aos
representantes do órgão municipal de trânsito que ele mesmo escolheu (cargo
político), a tarefa de cumprir e fazer cumprir as leis de trânsito, dentre
outras atribuições. Clique no link para conhecer o que é de atribuição dos
municípios no CTB: http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10624984/artigo-24-da-lei-n-9503-de-23-de-setembro-de-1997 A iniciativa de encaminhar projetos em assuntos de trânsito é do
prefeito, do Executivo, e o trabalho e participação dos vereadores começam assim
que o Projeto de Lei é apresentado na Câmara, podendo propor as devidas
melhorias, desde que não conflitem com leis, Resoluções e competências já
estabelecidas.
No que se refere à
competência dos vereadores em matéria de trânsito, os especialistas no assunto
afirmam, seguramente, não se
tratar de matéria de interesse local, haja vista ter sido reservada
expressamente e de forma privativa, à União (art. 22, Constituição Federal). Se
os Estados, Municípios e Distrito Federal insistirem em legislar sobre essa
matéria estarão invadindo a competência exclusiva da União. Diz o jurista e
doutrinador José Afonso da Silva que “O Poder Público está
atrelado ao mandamento legal, não podendo dele se afastar, sob pena de
responsabilização do agente público, nas esferas administrativas, penal e
civil.”
Ainda que no artigo 30 da Constituição
Federal conste que compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse
local, isto não se aplica às leis de trânsito. Quem é do Direito sabe quem é Hely
Lopes Meireles e suas obras sobre Direito Municipal. Vejam o que ele diz: “Interesse local não é interesse exclusivo do
Município; não é interesse privativo da localidade; não é interesse único dos
municípios. Se se exigisse essa exclusividade, essa privatividade, essa unicidade,
bem reduzido ficaria o âmbito da Administração local, aniquilando-se a
autonomia de que faz praça a Constituição. Mesmo porque não há interesse
municipal que não o seja reflexamente da União e do Estado-membro, como,
também, não há interesse regional ou nacional que não ressoe nos Municípios,
como partes integrantes da Federação brasileira. O que define e caracteriza o 'interesse local', inscrito
como dogma constitucional, é a
predominância do interesse do
Município sobre o do Estado ou da União" (grifos originais).”
Outro jurista bem conhecido de todos,
Michel Temer, afirma: “É, portanto, de
pouca ou de nenhuma valia tentar fundar proposta que insinue competência aos
Municípios para legislar sobre matéria de trânsito por considerá-la de interesse local. Seguramente,
os serviços de trânsito representam atividade relativa à ordem pública, cuja
competência legislativa cabe à União e aos Estados-membros conforme se vê no
artigo 144, da Lei Maior.”
Dessa forma, esperamos que com essa
proposta de levar Educação Para o Trânsito à população em uma linguagem que ela
entenda, os senhores vereadores em todo o país também entendam que não podem
apresentar projetos de lei para legislar em assuntos de trânsito. Têm que
esperar o Executivo fazer isso e aí sim, proporem as melhorias. Mas, tanto o
Executivo quanto o Legislativo Municipal devem respeitar o que diz a legislação
de trânsito e a Constituição Federal.