300x250 AD TOP

quinta-feira, 13 de março de 2014

Encontrado em: , ,

Trânsito - A cegueira coletiva em relação aos ciclistas e à mobilidade em Blumenau

Por Márcia Pontes
Educadora de Trânsito

Imagem: Divulgação
Mesmo sem se ter uma contagem dos ciclistas em Blumenau, eles já foram chamados de grupos minoritários e barulhentos. Já disseram que tem pouco ciclista para justificar a construção de ciclovias e ciclofaixas na cidade. Há quem os acuse de atrapalhar o trânsito e até de serem culpados pelos acidentes. 
 
Todo motorista deveria saber que estacionar na ciclofaixa é infração de trânsito, mas ainda assim estacionam e ainda ameaçam os ciclistas que tentam fotografar o abuso.

Alheios a identidade histórica e cultural que Blumenau tem com a bicicleta, parece que a cidade só lembra dos ciclistas em época de Oktoberfest para pedalar as bikes enfeitadas. No dia a dia, é cegueira coletiva. Muitos sequer aceitam a realidade de que muitas pessoas vão e voltam para o trabalho de bicicleta. Já viram como fica o bicicletário das empresas nos três turnos de trabalho? E a Rua XV aos domingos? Já viram quantos ciclistas?

Outros negam a realidade de que muitas crianças vão e voltam da escola de bicicleta. Elas, as crianças ciclistas são tão invisíveis aos olhos da sociedade e do poder público que sequer são incluídas nos cartazes e folders das campanhas que alertam para os cuidados no trânsito na volta às aulas.


Até pouco tempo era comum de se distribuir às crianças nos eventos realizados na Vila Germânica, uma folha para pintar e associar o desenho ao nome dos principais meios de locomoção. Tinha lá o ônibus, o carro, a motocicleta, o avião e o caminhão. Curiosamente, o caminhar (principal meio de locomoção do pedestre) e a bicicleta, mesmo sendo reconhecida pela ONU como o principal meio de locomoção não motorizado, sustentável e que não agride o meio ambiente, não estava lá. É como se o pedestre e ciclista não tivessem importância numa cidade que insiste em ser feita para os carros e atender as necessidades de mobilidade somente dos motoristas.

Imagem: Divulgação
Vejam a maioria expressiva das pistas educativas de trânsito em que a preocupação maior é formar o motorista do futuro, como se tudo girasse em torno dos veículos motorizados. As bicicletas até substituem os carros e motos porque criança não pode dirigir, mas sempre incorporando o papel do carro ou da moto. Algumas, sequer espaço e sinalização para ciclistas tem.

Para quem viu e ouviu em época de campanha política que a cidade deve ser feita para as pessoas e para isso haveria um choque de gestão, o que se vê é a prioridade para os carros e um choque digestão diante da imobilidade urbana. Ou não é indigesto ver uma rua como a João Pessoa dividida em 3 faixas priorizando os carros e nenhum espaço para quem pedala? Indigesto até para o motorista, que não tem como cumprir a distância de segurança de 1,5 metros do ciclista e que para dar a preferência à eles tem que invadir a contramão por cima de faixa com linha contínua dupla.

As mudanças na Rua João Pessoa agradaram muito aos motoristas, pois agora eles tem mais uma pista para correr e isso tem diminuído o tempo de trajeto. Para os mesmos motoristas que aprovaram as 3 pistas e continuam caindo dentro das crateras que se formam ao longo da via está ótimo.
 
Imagem: Divulgação
Só que tem um detalhe: mobilidade é para todos, não só para o motorista. Experimentem sair do conforto de seus carros e caminhar pelas calçadas esburacadas, em desnível, com capim e poste no meio.

Experimentem sair do conforto de seus carros e pedalar para o trabalho, para o lazer, para o que for, não só pela João Pessoa, mas por todas as ruas da cidade que aí eu quero ver quanto dura a satisfação.
Já ouvi e li referências aos ciclistas como hipócritas porque numa cidade com o relevo como o de Blumenau não se pode levar as crianças na escola ou a mulher no trabalho, principalmente em dias chuvosos de bicicleta.

Mas, a hipocrisia maior está num argumento de vidro como esse, como se todos que incentivam a bicicleta fossem inimigos do carro ou como se quisesse tirar os carros da rua e trocá-los por bikes. Sem extremismos, trata-se do uso consciente do automóvel, utilizando-o apenas para aqueles casos em que não é possível usar a bicicleta.

A bicicleta é um meio alternativo de transporte incentivado para trajetos curtos que se pode percorrer mais rápido do que os carros em poucos quilômetros. E nos dias chuvosos há outras opções como o transporte público, - que concordo não seja lá essas coisas – e até a carona solidária.

Quantos carros vemos diariamente circulando pela cidade com apenas o motorista quando poderia levar amigos, vizinhos e evitar que cada um na mesma família saia com o seu próprio carro quando poderiam sair todos num carro só?

Conheço pessoas que moram no Centro da cidade e para irem até locais próximos na Ponta Aguda não dispensam o carro quando poderiam fazer uma boa caminhada ou irem de bike.
Não são poucas as pessoas que ficam paradas a maior parte do tempo em engarrafamentos no final de tarde para irem a academia pedalar quilômetros numa bicicleta que não sai do lugar e ainda pagarem por isso.

É fato que muitas pessoas ainda não incluíram a bicicleta em sua rotina por falta de segurança para pedalar. Segundo a ABC Ciclovias a demanda reprimida formada por pessoas que gostariam de pedalar, mas não o fazem por falta de ciclovias e ciclofaixas é de 70% de uma amostra que quanto mais aumenta, mais se mantém expressiva e reprimida.

Imagem: ABC Ciclovias
Para quem diz que não tem ciclista que chega na cidade para justificar as ciclovias e ciclofaixas, a contagem realizada no dia 8 de março no Cruzamento da Rua João Pessoa com a Marechal Deodoro e Rua Tijucas registrou 45 ciclistas em apenas 2 horas. Foram 40 homens e 5 mulheres; 30 pedalavam na via; 15 em cima da calçada; 18 usavam capacete e dois transportavam crianças.
 


Registre-se que a contagem foi feita por ciclistas da ABC Ciclovias e não por quem, por dever de ofício, deveria dar importância e se interessar em fazer. Mas, eles não querem enxergar os ciclistas!
Será que esse contingente de ciclistas já não justificaria mais visibilidade, mais cuidado, mais planejamento, mais estudos, mais respeito e mobilidade por parte do poder público? 

Motoristas quando estão dirigindo no conforto de seus carros não enxergam o ciclista. Os tratam como inimigos, como um estorvo na via. O poder público não enxerga o ciclista porque caminha na contramão da mobilidade para todos e prioriza os carros. Em meio à cegueira coletiva, não se enxerga aquilo que não se quer ver. Estamos de olho!