Por Márcia Pontes Educadora de Trânsito
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Imagem: Reprodução |
O ano novo mal chegou e em suas primeiras
semanas já está se mostrando um ano violento para o trânsito no Vale do Itajaí.
A impressão que se tem é que a violência está sem controle, desmedida,
exagerada, e que fazia tempo que não se começava um janeiro com tantos
acidentes e mortes no trânsito. Com um detalhe: os mais jovens estão morrendo cada
vez mais cedo. Cedo demais!
Lamentamos pelas vidas que se
vão, mas e a dor de quem fica? A dor do pai, da mãe, de quem é "pãe" (pai e mãe
ao mesmo tempo) e se sente destroçado, estraçalhado, destruído por uma dor que de
tanto que dói não se sabe se é na alma ou se é física.
De todo o meu coração e com os
mais profundos sentimentos às vítimas e suas famílias, como ser humano e como
profissional que assumiu o compromisso existencial com a segurança no trânsito,
eu não tenho como expressar a dor dos pais dos 3 jovens, garotos, meninos que
perderam a vida de forma violenta num acidente em Gaspar.
A dor dos pais do Lucas, de
apenas 16 anos, que estava no banco de trás. A dor dos pais do Cleverson, 19
anos, o jovem motorista, tampouco a dor dos pais do Tiago, 18 anos, que estava
no banco da frente.
Era por volta de 2h da madrugada
quando o carro em que eles estavam colidiu contra um Palio, bateu na mureta de
proteção e precipitou-se no ribeirão. Chovia muito nessa hora, a correnteza era
forte e muito entulho era arrastado para o Rio Itajaí-Açu.
Imagem: Jaime Batista da Silva |
Se eles estavam sem cinto de
segurança ou se foram arrastados após desafivelarem o cinto é uma resposta que
se foi junto com eles. O corpo de Lucas só não foi arrastado pela correnteza porque ficou preso às ferragens. O que se sabe é que estavam numa festinha e saíram para comprar mais bebidas. Mas, o que resta agora é a dor dos pais, acima de qualquer
outra dor.
A mesma dor de todo pai, de toda
mãe que se despede do filho que vai sair de carro, que lhe dá um beijo ou que
apenas pede que tenha cuidado enquanto vê, sem saber, pela última vez o filho
vivo e fica se admirando como ele cresceu! Como ele está lindo!
A mesma dor de um pai, de uma
mãe, que é acordado às pressas, de supetão na madrugada por uma ligação das
equipes de resgate avisando que aconteceu o pior.
Recentemente, um casal de amigos
instrutores de trânsito perdeu o seu caçula de 26 anos, também instrutor de
trânsito. A gente apoia, a gente abraça, a gente chora junto, a gente pratica
toda solidariedade que a nossa humanidade nos permite nessa hora, mas jamais
poderemos mensurar 1% da dor de perder um filho ainda tão jovem assim.
Quem é pai, quem é mãe, quem
sabe, depois de ler este artigo abrace forte o seu filho e diga: “Deus me livre
de uma dor dessas!”. Ou, quem sabe, apenas ignore.
O fato é que estamos assistindo o
tempo todo a tantas mortes de condutores e passageiros cada vez mais jovens e
com tanta frequência que o temor maior é que isso nem choque mais, nem comova
mais as pessoas.
Imagem: Reprodução |
Meu medo é que a violência e as
mortes nos acidentes de trânsito nos roubem a capacidade de nos sensibilizarmos
com a dor e o sofrimento do outro, até porque o trânsito não poupa ninguém. Até
porque não temos garantia de nada e não sabemos quem será a próxima vítima. Não
se sabe se o próximo será o nosso filho, o filho do vizinho, de um colega de
trabalho ou mesmo aquele cujo filho nem nasceu e ele ainda é o filho.
A única certeza que temos é que essa é
uma dor que ninguém pensa que vai sentir um dia, até que sente.
Há quem diga que dá uma sensação
de impotência, de desamparo, de abandono. Há quem diga que o chão se abre nessa
hora, mas desgraçadamente não nos engole para acabar com aquela culpa de não
termos conseguido fazer nada pelo próprio filho. De não conseguir protegê-lo.
Dizem que todo homem e que toda
mulher muda por completo depois que o filho nasce. Mas, o que sabemos é que
eles mudam muito mais depois que perdem um filho num acidente de trânsito.
Historicamente, são sempre os
mais jovens e com menos tempo de habilitação os que mais se envolvem em
acidentes com mortes, mas isso parece entrar por um ouvido e sair pelo outro.
Enquanto as vias públicas vão
virando campos de extermínio, fico pensando nos diferentes tipos de pais e de
filhos e como eles lidam com a questão da primeira habilitação; de aprender a
dirigir antes do tempo; com a decisão de emprestar ou presentear o filho com um
carro porque fez 18 anos, porque passou no vestibular... mas, acima de tudo,
como eles orientam e constroem limites na vida e no volante com os seus filhos.
Imagem: Jornal de Santa Catarina |
Penso nas dificuldades que muitos
pais tem para educar nesses tempos de permissividade exagerada em que mal se completa
18 anos e já se ganha um carro. Muitas vezes, antes de iniciar o processo de
habilitação.
Tempos em que os pais trabalham demais e tem cada
vez menos tempo para conversarem com seus filhos. Tempos bem diferentes
daqueles em que a juventude transviada do passado matava e morria menos.
Enfim... lamentar e contar os mortos com pouca
idade em acidentes de trânsito é muito pouco. Nós, os pais e a sociedade,
estamos pagando um preço muito caro.
Uma pergunta para a qual urgentemente temos de
buscar respostas: o que cada um de nós pode fazer para evitar essas mortes
prematuras no trânsito?
Este artigo é dedicado aos meus amigos Fernando Diniz, Odete e Luis Carlos. Aos pais do Lucas, do Cleverson, do Tiago e à todos os pais que ficaram órfãos de seus filhos em acidentes de trânsito.
Este artigo é dedicado aos meus amigos Fernando Diniz, Odete e Luis Carlos. Aos pais do Lucas, do Cleverson, do Tiago e à todos os pais que ficaram órfãos de seus filhos em acidentes de trânsito.