Por Fabiano Uesler
Muito
se ouve falar nos últimos tempos sobre o termo “Estado Laico” e
consequentemente muitas dúvidas surgem em relação ao tema. No artigo 19
da nossa Constituição temos estabelecido o seguinte: “É vedado à União,
aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer
cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o
funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de
dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de
interesse público.” Esta disposição caracteriza o estado Brasileiro como
Laico, ou seja, aquele que não possui uma religião oficial, pois é um
estado secular que se mantém neutro e imparcial nos temas religiosos. É
função do estado laico, estabelecer ações que prezem a boa convivência
entre credos e religiões, combatendo o preconceito e a discriminação
religiosa.
Foto: Reprodução. |
Devemos
também salientar que estado laico não pode ser confundido com estado
ateu, sendo que o ateísmo e seus assemelhados também se incluem no
direito à liberdade religiosa. De acordo com o Jurista Pontes de
Miranda: “liberdade de crença compreende a liberdade de ter uma crença e
a de não ter uma crença” (Comentários à Constituição de 1967).
Portanto o direito de não ter uma religião é também defendido pela nossa
constituição.
O
Brasil, em sua laicidade tem como fator predominante a inexistência de
uma religião oficial, o que não o caracteriza como um estado ateu ou
partidário da não crença, pois ao mesmo, como já dito, prepondera o
princípio da liberdade religiosa tornando, portanto, o estado neutro a
relações religiosas. Não podemos, porém permitir que o estado tome
posicionamentos religiosos da mesma maneira que não pode insurgir na
“não crença”. Observemos por exemplo nossa antiga Câmara de Vereadores
no prédio da Prefeitura de Blumenau que ostentava uma grande “Cruz” em
seu plenário. Atualmente podemos sim considerar este ato como
tendencioso e uma afronta à laicidade estabelecida pela nossa
Constituição. Prudentemente em seu novo prédio não encontramos mais este
símbolo religioso. O mesmo ocorre quando temos vereadores “orando” em
seções da câmara. Você deve estar perguntando, mas que mal há afinal em
“rezar” antes da sessão? Se você é cristão certamente não vê este ato
como algo tendencioso, porém pense da seguinte maneira, imagine o
vereador X rezando um pai nosso no início da sessão, em seguida o
vereador Y discorrendo sobre o ateísmo, em seguida o vereador Z dando um
“passe” para os presentes o vereador H rezando um trecho do talmude e
finalmente, o vereador U lendo o alcorão. Isso seria bizarro e cômico ao
mesmo tempo. Logicamente isso não ocorre, mas serve como exemplo para o
fato de que toda pessoa tem sua liberdade de credo garantida pela
constituição, porém cabe o bom senso e ao estado não permitir que o
mesmo sirva de palanque para propaganda religiosa, pois a “fé” de um não
pode ferir ou desrespeitar a “fé” ou a “ausência de fé” do outro. Além
do mais cabe aos vereadores “Legislar” e não demonstrar seus credos em
plena seção, pois, acaba por ferir nossa Constituição no que tange à laicidade.
Não discorro “contra” o cristianismo, porém discorro contra qualquer posição tendenciosa e religiosa vinda do poder público. O movimento tão criticado por muitos que foi o de tirar o termo “Deus seja louvado” das nossas notas de Reais é na verdade um movimento em favor da preservação da neutralidade do nosso Estado e da diversidade religiosa. Imagine outros termos semelhantes em nossas notas de real, afinal, se pode haver um “Deus seja louvado” pode haver também “Buda seja louvado”, “Alá seja louvado”, “Lula seja louvado”, “Salve Oxossi”, “Salve Lord Ganesha” ou “Deus não existe”, pois afinal de contas se uma religião ou expressão religiosa pode constar na cédula de real, que todas possam ou de maneira mais neutra e de forma a respeitar nossa constituição, que nenhuma possa nem mesmo o ateísmo.
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Portanto sabemos que a manter a neutralidade e a laicidade do nosso estado garante de fato uma liberdade de crença plena a todos os cidadãos brasileiros. Qualquer ação de cunho religioso dentro da nossa política pode ameaçar esta neutralidade. Devemos manter nosso estado livre de qualquer forma de “crença” ou “não crença” para que a liberdade de credos não seja cerceada e para que não venha a existir nenhuma lei de cunho religioso. Devemos manter a laicidade para que todos possam professar suas crenças e inclusive sua não crença, devemos manter nosso estado neutro, laico e livre.
Publicado originalmente no Portal Blumenews em: Terça, 04 Junho 2013 02:50 +Blumenews de Blumenau e na Revista Ateísta Ano 1 Nº 1 em Outubro de 2013