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quarta-feira, 16 de outubro de 2013

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Sociedade e Religião - Estado Laico não é Estado Ateu.

Por Fabiano Uesler  

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Foto: Reprodução.
 Muito se ouve falar nos últimos tempos sobre o termo “Estado Laico” e consequentemente muitas dúvidas surgem em relação ao tema. No artigo 19 da nossa Constituição temos estabelecido o seguinte: “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.” Esta disposição caracteriza o estado Brasileiro como Laico, ou seja, aquele que não possui uma religião oficial, pois é um estado secular que se mantém neutro e imparcial nos temas religiosos. É função do estado laico, estabelecer ações que prezem a boa convivência entre credos e religiões, combatendo o preconceito e a discriminação religiosa.

   Devemos também salientar que estado laico não pode ser confundido com estado ateu, sendo que o ateísmo e seus assemelhados também se incluem no direito à liberdade religiosa. De acordo com o Jurista Pontes de Miranda: “liberdade de crença compreende a liberdade de ter uma crença e a de não ter uma crença” (Comentários à Constituição de 1967).  Portanto o direito de não ter uma religião é também defendido pela nossa constituição.

   O Brasil, em sua laicidade tem como fator predominante a inexistência de uma religião oficial, o que não o caracteriza como um estado ateu ou partidário da não crença, pois ao mesmo, como já dito, prepondera o princípio da liberdade religiosa tornando, portanto, o estado neutro a relações religiosas. Não podemos, porém permitir que o estado tome posicionamentos religiosos da mesma maneira que não pode insurgir na “não crença”. Observemos por exemplo nossa antiga Câmara de Vereadores no prédio da Prefeitura de Blumenau que ostentava uma grande “Cruz” em seu plenário. Atualmente podemos sim considerar este ato como tendencioso e uma afronta à laicidade estabelecida pela nossa Constituição. Prudentemente em seu novo prédio não encontramos mais este símbolo religioso. O mesmo ocorre quando temos vereadores “orando” em seções da câmara. Você deve estar perguntando, mas que mal há afinal em “rezar” antes da sessão? Se você é cristão certamente não vê este ato como algo tendencioso, porém pense da seguinte maneira, imagine o vereador X rezando um pai nosso no início da sessão, em seguida o vereador Y discorrendo sobre o ateísmo, em seguida o vereador Z dando um “passe” para os presentes o vereador H rezando um trecho do talmude e finalmente, o vereador U lendo o alcorão. Isso seria bizarro e cômico ao mesmo tempo.  Logicamente isso não ocorre, mas serve como exemplo para o fato de que toda pessoa tem sua liberdade de credo garantida pela constituição, porém cabe o bom senso e ao estado não permitir que o mesmo sirva de palanque para propaganda religiosa, pois a “fé” de um não pode ferir ou desrespeitar a “fé” ou a “ausência de fé” do outro. Além do mais cabe aos vereadores “Legislar” e não demonstrar seus credos em plena seção, pois, acaba por ferir nossa Constituição no que tange à laicidade.

   Não discorro “contra” o cristianismo, porém discorro contra qualquer posição tendenciosa e religiosa vinda do poder público. O movimento tão criticado por muitos que foi o de tirar o termo “Deus seja louvado” das nossas notas de Reais é na verdade um movimento em favor da preservação da neutralidade do nosso Estado e da diversidade religiosa.  Imagine outros termos semelhantes em nossas notas de real, afinal, se pode haver um “Deus seja louvado” pode haver também “Buda seja louvado”, “Alá seja louvado”, “Lula seja louvado”, “Salve Oxossi”, “Salve Lord Ganesha” ou “Deus não existe”, pois afinal de contas se uma religião ou expressão religiosa pode constar na cédula de real, que todas possam ou de maneira mais neutra e de forma a respeitar nossa constituição, que nenhuma possa nem mesmo o ateísmo.

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Foto: Reprodução.
   Observamos novamente que estado laico não é um estado ateu, é sim um estado neutro, oposto os estados teocráticos nos quais a religião tem papel ativo na política e até mesmo na constituição, como é o caso de Israel, Irã e do Vaticano, entre outros. Quanto mais partidos “cristãos” entram em nossa política propondo leis tendenciosas e de cunho religiosos, mais me preocupo com a manutenção da nossa liberdade, pois leis como a da “cura gay” entre outras ferem o princípio básico da isonomia e da preservação do indivíduo e de sua liberdade. Podemos de fato estar caminhando para uma teocracia velada que surge como políticos pertencentes a igrejas evangélicas ou pentecostais que têm uma visão quase medieval das relações humanas. Passamos em nossa história humana por períodos tenebrosos gerados justamente pela imposição de religiões sobre os estado como a idade das trevas através da igreja católica e atualmente dos estados islâmicos. É um retrocesso pra raça humana qualquer forma de estado teocrático, pois todos acabam cerceando as conquistas obtidas em tantos anos de luta. Imagine você mulher novamente sendo reduzida a um objeto, a um mero “animal” doméstico tendo como únicos propósitos a procriação e o trabalho doméstico. Não há nada de errado com ambos, ser mãe e cuidar de casa deve, porém ser uma escolha individual e não uma imposição. 

   Portanto sabemos que a manter a neutralidade e a laicidade do nosso estado garante de fato uma liberdade de crença plena a todos os cidadãos brasileiros. Qualquer ação de cunho religioso dentro da nossa política pode ameaçar esta neutralidade. Devemos manter nosso estado livre de qualquer forma de “crença” ou “não crença” para que a liberdade de credos não seja cerceada e para que não venha a existir nenhuma lei de cunho religioso. Devemos manter a laicidade para que todos possam professar suas crenças e inclusive sua não crença, devemos manter nosso estado neutro, laico e livre.

Publicado originalmente no Portal Blumenews em: Terça, 04 Junho 2013 02:50  +Blumenews de Blumenau e na Revista Ateísta Ano 1 Nº 1 em Outubro de 2013