Está lá no art. 69 do CTB: o pedestre que atravessa fora da faixa até 50 metros de distância é considerado culpado pelo próprio atropelamento. Mas, esta semana a notícia de que uma idosa de 81 anos morreu atropelada por uma viatura da Polícia Militar ao atravessar fora da faixa, com o semáforo aberto para os carros, e o Estado está cobrando na Justiça o conserto da viatura, orçado em R$ 6 mil, deu o que falar! A pendenga judicial já arrasta desde 2007.
A família da idosa afirma que ela atravessou na faixa, contesta a versão da polícia e do inquérito policial militar de que a culpa pelo próprio atropelamento tenha sido da própria vítima, mas o Estado não abre mão do tal “procedimento padrão”.
Não são poucas as decisões judiciais que determinam que o pedestre negligente com a própria segurança é o culpado pelo acidente. É conhecida a sentença do Tribunal de Justiça do Paraná que isentou do dever de indenizar o condutor que atropelou pedestre que atravessava a avenida Mauá, em Maringá, em local impróprio e inseguro por considerar culpa exclusiva da vítima.
Mas, será que no caso de uma senhora de 81 anos, podemos mesmo falar em negligência ou imprudência? Afinal, ela atravessava em cima ou fora da faixa antes de ser morta? A verdade teria morrido com ela naquele atropelamento?
Para alguns, adotar o que o Estado chama de “procedimento padrão” para cobrar na Justiça o conserto da viatura chega a ser exagerado e insensível diante da perda de uma vida humana nessas condições. Cabe considerar o “perdão piedoso”, como bem explica o amigo Fernando Pedrosa, aplicado àqueles que, por um infortúnio do destino, causam a morte de quem amam? Poderia ser o perdão piedoso aplicado à própria vítima de 81 anos?
Sabemos que idosos têm características diferenciadas dos demais pedestres: são mais lentos, têm a percepção e os sentidos diminuídos pela idade, mobilidade reduzida, dificuldade de perspectiva, de visão, de audição, de calcular distâncias e velocidade dos veículos.
Se por um lado o texto do art. 29 do CTB determina quem, em ordem decrescente, os veículos de maior porte serão sempre responsáveis pela segurança dos menores, os motorizados pelos não motorizados e, juntos, pela incolumidade dos pedestres, por outro, temos o art. 254, que proíbe o pedestre de atravessar fora da faixa, de cruzar a pista onde não é permitido, nas áreas de cruzamentos e de desobedecer a sinalização de trânsito.
O dia em que tal artigo for regulamentado pelo CONTRAN os pedestres passarão a ser autuados por infração leve e pagarão multa correspondente à metade da infração paga pelos condutores (R$ 26,60).
Colocando em relevo o art. 69 do CTB, antes de cruzar a pista de rolamento o pedestre deverá tomar precauções de segurança, levando em conta, principalmente, a visibilidade, a distância e a velocidade dos veículos, utilizando sempre as faixas ou passagens a ele destinadas sempre que estas existirem numa distância de até 50 metros dele. Trocando em miúdos: atravessou fora da faixa em até 50 metros, o pedestre é considerado culpado pelo próprio atropelamento.
Outras recomendações do art. 69 do CTB são: cruzar a via em sentido perpendicular de seu eixo onde não houver faixa ou passagem para permanecer menos tempo possível exposto na pista de rolamento; obedecer a indicação de luzes do semáforo e os sinais dos agentes de trânsito e onde não existir faixas de travessia nas interseções, atravessar no prolongamento da calçada.
Nenhuma pessoa deverá adentrar na pista sem antes se certificar de que podem fazê-lo sem obstruir o trânsito de veículos e, uma vez iniciada a travessia de uma pista, os pedestres não deverão aumentar o seu percurso, demorar-se ou parar sobre ela sem necessidade.
Onde houver semáforo, o motorista deverá aguardar que os pedestres completem a travessia na faixa mesmo com o sinal verde aberto para os veículos. Trocando em miúdos: na mudança de sinal de vermelho para verde, o pedestre colocou o pé na faixa o motorista coloca o pé no freio e aguarda!
Enquanto escrevia este artigo, eis que o amigo Jael me avisa: mais um atropelamento de idosa na faixa na Rua das Missões. Um condutor parou para a idosa atravessar, mas a motorista que trafegava ao lado não parou. Alegou que não viu a pedestre atravessando a rua e acabou provocando o atropelamento.
Há 7 dias do Maio Amarelo, um movimento internacional em defesa da vida no trânsito, cabe a reflexão: a cada 7 minutos um pedestre é atropelado no Brasil e a cada 22 minutos uma pessoa perde a vida no trânsito.
Vamos dirigir e nos comportar em via pública com o mais alto cuidado pela vida. Seja motorista ou pedestre.
OBSERVAÇÃO: Que fique claro que o art. 69 do CTB não menciona a culpabilidade, até porque trata das Normas de Circulação e Conduta, mas o texto deste artigo tem sido utilizado pelos Magistrados para fundamentar a culpa do pedestre em ações e decisões judiciais. Quem decide e determina a culpabilidade do pedestre é a Justiça com base no CTB. Segue uma das muitas decisões judiciais que determina a culpa do pedestre para o acidente caso atravesse até 50 metros da faixa de pedestres.
ATROPELAMENTO PEDESTRE FORA DA FAIXA DE SEGURANÇA - CULPA DO PEDESTRE COM BASE NO DESRESPEITO AO ART. 69 CTB
TJ-RS - Apelação Cível AC 70052139672 RS (TJ-RS)
Data de publicação: 04/03/2013
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRAVESSIA DE PEDESTRE FORA DA FAIXA DE SEGURANÇA. ATROPELAMENTO. Para cruzar a pista de rolamento, o pedestre deve tomar precauções de segurança, utilizando as faixas ou passagens a ele destinadas sempre que estas existirem numa distância de até cinqüenta metros dele - art. 69 , do CTB . Caso em que a prova evidenciou que a vítima não observou esta cautela, embora, nas proximidades houvesse faixa de segurança. Coletivo, de outro lado, que realizou a manobra de inflexão em velocidade reduzida e quando o sinal lhe era favorável. Circunstâncias que não permitiam ao motorista visualizar a travessia imprudente do pedestre. Responsabilidade objetiva da empresa demandada, prestadora de serviço público, afastada, em virtude da culpa exclusiva da vítima. Excludente do dever de indenizar. Ação julgada improcedente. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70052139672, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Aquino Flôres de Camargo, Julgado em 28/02/2013)